sábado, 10 de março de 2007

40 horas de paciência

No filme A vida dos outros, o capitão Gerd Wiesler, competente oficial da Stasi, ensina a seus alunos que, para conseguir que o prisioneiro confesse, "tem que ter paciência, 40 horas de paciência".

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No inquietante romance de ciência-ficção (ou, deveríamos dizer de ciência-anticipação?) "Mil novecentos oitenta e quatro", George Orwell escreve:

É claro, não era possível saber quando vigilavan a gente. Não era mais que uma conjetura saber quantas vezes e como a Polícia do Pensamento captava a comunicação da gente.

A vigilância a que o ser humano submete á seus congêneres é uma das condutas que lhe diferencian dos animais. Alguns anos atrás, o paleontólogo Stephen Jay Gould escriveu um artigo no qual falava dos muros de ouro que alguns pensadores e científicos tinham levantado para tentar preservar e diferenciar o ser humano dos outros animais. Os tijolos destes muros eram condutas como a fabricação de ferramentas, a capacidade de abstração ou a cultura.

Porém, bastantes estudos publicados nos últimos anos tem demostrado que algumas espécies animais (especialmente alguns primates) são capazes de fabricar instrumentos e de os usar. Algumas observações demostram que alguns pássaros podem planificar seu futuro (outra das capacidades supostamente de exclusividade humana) e armazenar alimentos em lugares estratégicos para épocas de penúria. Inclusive os pesquisadores descobriram padrões culturais em colônias de macacos.

Faz tempo que sabemos que, por exemplo, entre as formigas ou as abelhas, existem rainhas e obreiras; existen sindicatos? Bom, provavelmente não com este nome; mas, também descobriram condutas cooperativas em espécies animais, padrões de comportamento que não beneficiam direitamente ao indivíduo, e sim a comunidade.

Inclusive uma coisa como o conforto em casa, também não é exclusivamente humano: alguns grandes primates, antes de se sentar buscam folhas onde colocar suas nádegas, como una almofada fofa para não se sentar direitamente na desagradável umidade da floresta.

Á vista destas pesquisas, talvez os dois últimos muros dourados seríam o dinheiro e o sistema policial. Condutas como o pagamento a outros congêneres em troca pelo trabalho (o uso do "dinheiro") -o que está estreitamente relacionado com o conceito da escravidão-, ou o julgamento moral e, com ele, a existência da polícia que permite que um indivíduo com poder controle outros indivíduos sem esse poder. Se for assim, é muito triste o que nos separa dos outros animais.

A vida dos outros é uma excelente reflexão sobre o sistema policial. Para os interessados, um artigo de José Comas explica a experiência pessoal do próprio intérprete do filme: a esposa do ator Ulrich Mühe foi informadora da Stasi.

[Tradução do autor. Me desculpe os erros]

Enlaces de interesse:
A vida dous outros
Trailer - A vida dos outros
A vida dos outros - ficha têcnica
George Orwell - 1984
Trailer - 1984
El actor, su mujer y la Stasi

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