quarta-feira, 11 de julho de 2007

Des-humanizando

Uns anos atrás, Eudald Carbonell, um dos pesquisadores da jacida de Atapuerca, publicou um livro titulado Ainda não somos humanos. Sua hipótesi era que ao Homo sapiens ainda lhe tem muito caminho na frente até chegar á humanização completa.

espejo de la sociedad

Como explica Carbonell, apesar da revolução da técnica, a espécie humana não estará totalmente humanizada até o momento en que um pensamento social crítico permita uma vida melhor para todos e a solidaridade seja uma marca de nossa espécie.

Lembrei este livro o outro domingo lendo uma notícia no jornal de Barcelona La Vanguardia e uma entervista no Magazine do mesmo jornal. Antonio Cerrillo colocou o seguinte título na notícia: "Tratamento de deshumanização", e explica o estudo que estão fazendo sobre a maneira de conseguir deshumanizar os macacos criados em circos e outros espetáculos. A pesquisa, dirigida por uma equipe da Universitat Rovira i Virgili de Tarragona, analiza o processo pelo qual esses primates esquecem o hábito de dançar sevilhanas ou de fumar.

"É tanta a impregnação das condutas humanas nestes animais que eles não as esquecem mais", comenta uma das pesquisadoras.

A entervista a Syney Possuelo no Magazine titula-se "Se você calibra pela capacidade de sorrir, os índios são mais felizes que nós". Ele foi diretor da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), e explica sua experiência tratando de preservar os espaços dos indígenas do Amazonas da invasão dessa técnica que fala Carbonell: a do carro, a do celular e a dessa guerra mundial meio escondida que estamos sofrendo des de començos do século 21. Ele se pergunta se são realmente essenciais.

Os contrastes ainda são uma boa forma de percever algumas coisas, de provocar um automatismo no relé neuronal para comenzar a pensar. Então, só é preciso, afiar o espírito crítico, que é o motor para tentar melhorar as coisas.

[Tradução do autor. me desculpe os erros.]

Enlaces de interesse:
Entervista a Eudald Carbonell
Entervista a Sydney Possuelo
Funais

sábado, 23 de junho de 2007

Proibido ler

Quando a emblemática libraria Robafaves de Mataró (Barcelona) fiz 20 anos, Toni Cantó me presenteou uma edição especial de alguns contos de Voltaire com o título Sobre o horrível perigo da leitura.

Fachada-espejo

O primeiro motivo que do muftí Iussuf-Xeribí para condenar a recente chegada da imprensa é: Evidentemente, a facilidade de comunicar os pensamentos tem tendência a disipar a ignorancia, que é a guarda e a salvaguarda dos estados bem administrados.

Ontem lembrei este conto enquanto voltava para casa depois de acompanhar o paulistano José Castilho até o hotel onde fica estes dias, aquí em Barcelona. Tomamos cafezinho, champagne e o bolo tradicional de são Jõao (a coca) com Jordi e María, falando e rindo. José explicou para nós uma louvável iniciativa que está desenvolvendo o governo do Brasil no marco do Plano Nacional do Livro e Leitura. Tráta-se duma proposta desenvolvida no Ceará, onde 175 jovens e adultos especialmente treinados, são "agentes de leitura" com a missão de aproximar os livros ás pessoas. José nos mostrou uma bela coleção de ifotografias de crianças, adultos e idosos escutando como as palavras tecem histórias entranháveis, mágicas, surpreendentes ou tristes.

Lembram Antonio José Bolívar Proaño, o protagonista de Um velho que lia romances de amor, de Luís Sepúlveda?

Antonio José Bolívar Proaño tirou a dentadura postiça, a colocou embrulhada no lenço e, sem parar de praguejar o gringo inaugurador da tragédia, o prefeito, os garimpeiros, e todos os que prostituíam a virginidade da sua Amazonia, cortou um galho com o facão e, se apoiando nele, començou a caminhar em direção a El Idilio, a sua barraca, e a seus romances que falavam de amor com palavras tao bonitas que, às vezes, lhe fazíam esquecer a barbárie humana.

Agentes de leitura, uma dessas ocupações "simbiônticas", nas quais as duas partes tiram benefício. Quem, sorridente, tem acesso ao conteúdo do livro e quem, ao olhar o rosto sorridente experimenta uma emoção semelhante, em virtude da nova teoria dos "neurônios espelho".

[Tradução do autor. Me desculpe os erros.]

Enlaces de interesse:
Entrevista a José Castilho - sobre a leitura no Brasil
Plano Nacional do Livro e Leitura
Neurônios espelho

quarta-feira, 6 de junho de 2007

Fragância antiestresse

Estes dias, celebra-se a amostra Vilassar de Mar, un mar de flors, uma proposta popular para exaltar a primavera, dar rédea á criatividade, invitar ás pessoas a sair prá rua e estimular, além da vista, o olfato.

Jardí imaginari

A amostra tem 14 espaços onde foram recriados jardins aproveitando recantos que, ás vezes, passamos tantas voltas perto deles, que não os prestamos bastante atenção.

Acho muito bacana uma obra titulada "Jadim imaginário" que, seguindo a idéia original de Jordi Abelló, preoparou a Escola d'Art Floral da Catalunha no número 22 da rua Montserrat. A creação encontra-se num jardim que fica un metro por debaixo do nível da rua, no minúsculo espaço semi-uterino que são alguns dos pátios das antigas casas da vila da costa onde, além de tres ou quatro árvores de tronco grosso e boa sombra, costuma a ter uma fontezinha que proporciona uma agradável sensação auditiva de calma e frescor, e algum mosaico que cobre a parte baixa das paredes que o separam da casa do vicinho.

Este jardim imaginário mostra uma onírica nuvem vermelha onde os cravos -cujo cultivo substituiu faze anos o das famosas batatas da comarca do Maresme- parecem levitar ao encontro do nariz do visitante.

Desgraçadamente, muitos cravos já não desprendem aroma nenhum. E é uma pena, porque alguns estudos científicos mostram o potente efeito das fragâncias (e da lembrança de alguns aromas) para aumentar as concentrações de oxitocina, uma substancia muito relacionada com uma melhor adaptação das pessoas á seu ambiente social e com potente efeito antiestrés. Outro dos placebos com que nos presentea a natureza e que, com bastante freqüência, não sabemos aproveitar.

Achamos que perder a dependência do olfato é um signo da evolução, e tiramos o aroma dos alimentos e das flores, unificamos as fragáncias com aerosoles artificiais e lutamos contra nosso próprio cheiro. Talvez todo isso seja um erro.

[Tradução do autor. Me desculpe os erros.]

Enlaces de interesse:
Nota de Albert Calls sobre a amostra (em catalão)

sábado, 2 de junho de 2007

Bulimia emocional

No Panamá, conheci uma pessoa a quem você não pode perguntar aquele tópico: "O que você está lendo?" (para substituir o comentário ainda mais batido sobre algum aspeto do clima).

Piel de cocodrilo

E não é exatamente que a pessoa não goste de ler; muito pelo contrário: tem a capacidade para engolir un romance enteirinho em duas horas e, além disso, entrar no argumento, fazer acertados comentários críticos sobre os personagens ou a técnica narrativa. Me comentava: "Às vezes, sinto muito ser tão rápida porque perco o prazer de saborear a leitura".

Lembro esta frase ao colocar certo ordem eletrônico nas fotografías que tirei no Panamá e achar a que coloquei mais para cima. A sexta tinhamos programada a visita a dois hospitais de Coclé, a umas duas horas da capital. Ao terminar, nos detuvimos a paramos a almoçar chicharrones e milho na fonda La Fula, na vera da estrada de Aguadulce, com a intenção de não demorar muito e chegar á cidade antes da tranca do tránsito das sextas as cinco da tarde.

Aguadulce tem cana de açúcar e tem salinas. E tem praias no lado do Pacífico e algum porto esportivo, me falaram. Perguntei se tinha manguezais, e minha pergunta acabou dando ao dia a virada inesperada que dao as coisas quando as pessoas não se emperram em segurar as rédeas da vida com excessiva força por temor ao desconhecido.

O motorista da nossa perua tem um cunhado que mora em Antón, do lado da lagõa, e lançou a proposta de ir até lá. Uma de suas ocupações é caçar jacarés para comer com um anzol e, nos mostrou quatro ou cinco peles que tinha amontoadas perto da garagem de latão e tábuas de madeira. Acabamos a tarde bevendo água de coco que pegou da árvore e olhando o tempo passar, falando en umas redes que tinha pinduradas na sacada, enquanto na cidade de Panamá caia uma chuva tropical e algumas pessoas se desesperavam dentro do carro.

Como escreve Michel Lacroix no seu ensaio O culto das emoções, freqüêntemente a ânsia por vivir emoções "fortes" e "constantes", reduz a capacidade para admirar o redor e o saborear. Já falamos isso outras vezes: é necessário buscar a esponjosidade do tempo, o efeito levedura.

[Tradução do autor. Me desculpe os erros.]

Enlaces de interesse:
Penonomé - un cacique torturado por culpa del oro
Aguadulce
Michel Lacroix - Le culte de l'émotion

segunda-feira, 28 de maio de 2007

O dia que Lucía Etxebarria salvou minha vida

Coincidência. A IV Feria do Livro de Panamá coincide com uma visita que tenho que fazer na Universidade deste país e Priscilla Delgado, presidenta da Cámara Panameña del Libro, me invitou para apresentar Otimizar a Vida neste espacio.

Avenida Central

O sábado de manhã, Víctor Serrano decide me mostrar que Panamá é bem mais do que o tópico canal -e lhe agradeço muito a iniciativa, porque isso me fiz descobrir a beleza do bairro antigo da cidade-. Pelo jeito, após do saqueio do panamá Viejo pelo pirata Morgan a meados do século XVII, os sobreviventes construiram uma zona fortificada do outro lado da baía, que cheogou a ter o máximo esplendor a principios do século XX.

Posteriormente, o bairro velho cedeu protagonismo aos arranha-céus onde se cozinham os negócios modernos e se converteu em subúrbio até que alguma pessoa decideu inverter na restauração dos frágis edifícios que parecem desmoronar-se como a cinza. Como em muitas outras capitais, o turismo e o lazer noturno (os dois com seus dólares) empurram os inversores para recuperar os edifícios mais emblemáticos e aproveitar o piso térreo para colocar restaurantes, barzinhos e lojas.

Até o bairro velho chega-se pela Avenida Central. É uma rua de pedestres com grandes lojas aos dos lados que fornecem todo tipo de produtos ás pessoas que ainda não preferem os shoppings. Se uma pessoa não tem vontade de comprar, pode se dedicar a levantar os olhos por encima dos cartazes publicitários gigantes que cobrem a parte inferior dos prédios, até o primeiro ou o segundo andar. Atrás da crosta de pranchas de zinco mal pintadas, tábuas de madeira, cartazes de néon caolhos e lonas mais ou menos surradas, esconden-se interesantes edifícios, neoclássicos, modernistas e art-déco.

Curioso. Uma ruazinha muito estreita cruza a Avenida Central; eles a chamam de rua "Sal-si-puedes" (saia-se-puder). Tráta-se de un corredor estreito e oscuro com peqenas bancas de-todo-um-pouco lsuperpostas umas com as outras. "Aquí a gente acha qualquer coisa", me explicou o Víctor.

Cronometrado. Caminho devagar mas a passo constante, conversando com o Víctor. De repente, ele me pergunta pela obra literária de Lucía Etxebarría, uma escritora convidada na féria. Largo alguns títulos até que fico encalhado nos "corpos celestes". Duvido entre Laura, Andrea e Eva; porém, nenhum desses nomes me parece familiar. Saia dessa, se puder. E parei o passo como se caminhar não me deixase lembrar.

Em boa hora! Beatriz e os corpos celestes me sai da boca no mesmo momento que vejo cair livremente um enorme cartaz que estava pindurado embaixo de uma gran pantera cor de rosa; o cartaz ficou um caco dez metros mais para frente sobre a linha onde caminhamos. Os corpos celestes caíram sobre a calçada e naquele momento tive a sensação que Lucía Etxebarría salvou-me -pelo menos- de uma boa batida e alguns cortes.

Muitas vezes o ser humano obsesiona-se com a segurança e sente ansiedade pela incerteza, sem ser consciente de que o futuro imediato é tão ingobernável como um furacão ou um río de lava. Não existe horóscopo para adivinhar isso.

No seu poema Luz (do poemario "Actos de Amor y de Placer"), Lucía escreveu:

Quién sabe si fue azar o fue destino
(dos palabras opuestas pero iguales)
quién conjuró el minuto
quién conjuró el momento
en que un rayo de luz llegado de vete a saber dónde
(muchos dirían que de mi delirio)
(...)


[Tradução do autor. Me desculpe os erros]

Enlaces de interesse:
Cidade de Panamá
Lucía Etxebarría

quarta-feira, 23 de maio de 2007

Rotas, caminhos e veredas

Um dos ritmos silábicos que, faz séculos, chama a atenção de poetas e leitores é o 5-7-5 japonés, conhecido como haiku. O romancista do Uruguay Mario Benedetti publicou uma excelente coleção de haikus. Um deles diz:

las hojas secas
son como el testamento
de los castaños



Ruta del colesterol

Me lembro do livro de Benedetti (Rincón de haikus, Madrid: Visor, 1999; México: Alfaguara, 1999) por associação de idéias enquanto Luis Brizuela é meu cicerone em A Coruña, antes de participar no VI Paseo de la Salud organizado pelo Conselho Oficial de Farmacêuticos da província. Luis me leva pelo renovado passeio marítimo, desde o meu hotel, perto dos jadins Méndez Núñez , até além da praia de Riazor.

Ás cinco da tarde de uma sexta de primavera, com o céu cinzento e o mar tranqüilo, esperando uma chuva que parece inevitável, muitas pessoas correm, caminhan de pressa, praticam footing ou simplesmente passeiam. "A gente a chama de rota do colesterol", me explica Luis.

Perto da meta do concorrido caminho de Santiago, num cruzamento de culturas celtas e íberas, farol poderoso de uma via marítima difícil, mas freqüentada, sacada última dessa "terra ignota" que antigamente foram os oceanos -igual como é ignota a vida para qualquer pessoa, a partir deste mesmo instante.


Como escreveu Benedetti:

en la lontananza
se ven lenguas de fuego /
aquí hay rocío



[Tradução do autor. Me desculpe os erros]

Enlaces de interesse:
Mario Benedetti - Haikús

quinta-feira, 10 de maio de 2007

Suar ou deprimir-se?

Mais de dez anos atrás, Jordi Nadal descobreu para mim a contundência das palavras de Elias Canetti. No seu imprescindível A província do homem escreveu: Uma pessoa não sabe nada desde faz um momento; o que uma pessoa acha saber desde faz um momento, já faz muito tempo que o sabe. Só conta o conhecimento que vem repousando secretamente no interior dessa pessoa.

Juréia-06 (249)

Lembro estas palavras ao leer um dos artigos publicados recentemente na revista Newsweek com o título "O exercício é um estado da mente". No subtítulo, uma pergunta sugestiva: "O suor, é o novo antidepressivo?"

Seu autor, o médico da Harvard Medical School M. Craig Miller resume os resultados de alguns estudos recentes que apontan os efeitos potenciais do exercício sobre a indução do crescimento neuronal, inclusive em adultos e idosos; neles, estes processos apresentam uma redução progressiva, sobretudo em pessoas sedentárias.

Alguns destes estudos sugerem que fazer exercício moderado (por exemplo, caminar de pressa meia hora cada dia) poderia ter efeitos beneficiosos em estados depressivos; para alguns doentes, o efeito seria semelhante ao conseguido com o tratamento com remédios antidepressivous ou a psicoterapia... sempre que a pessoa esteja motivada para fazer exercício, uma coisa que, ao parecer, tem um enorme componente genético.

Seja qual for, pelo menos o exercício aporta mais oxigênio ao cérebro e ao estimular o desenvolvimento neuronal, poderia ser útil para retardar a evolução da demência em doentes com Alzheimer e, talvez também para melhorar os processos intelectuais. Ao comparar os resultados obtidos por estudantes em provas de matemáticas com a forma física, alguns estudos acharam uma correlação entre os dois fatores.

Talvez a idéia de complementar o estudo com o esporte, não seja bobagem. E, de maneira semelhante a frase de Canetti -e como ja acontece com tantas coisas- esto que agora a ciência está demostrando com complexas técnicas radiológicas e bioquímicas, na verdade ja tinha sido intuido pelos gregos quando inventaram as olimpíadas.

O exercício físico (e para isso não é preciso comprar custosos aparelhos nem pagar custosas academias) perfila-se como outro desses placebos da vida, que além dos efeitos físicos, produz bem-estar.


[Tradução do autor. Me desculpe os erros.]

Enlaces de interesse:
Elías Canetti - Nota en El País
Newswekk (9-04-2007) - Exercise and the brain

quarta-feira, 2 de maio de 2007

O cheiro da música

No filme A vida dos outros (já falamos dele em outro post), o protagonista muda totalmente sua conduta ao escutar as notas da Sonata para piano nº 23 "Appassionata" de Beethoven.

Musica de colores

No Dictionnnaire des idées reçues, Flaubert fala da música: Faz pensar em muitas coisas. É um adoçante da conduta. Em palavras da aristocrata da Martinica criada por Truman Capote no conto Música para camaleões, estes reptis são grandes amantes da música: Comença a interpretar uma sonata de Mozart. Finalmente, os camaleões acumularam-se: uma dúzia, outra dúzia, a maioria deles verdes, alguns escarlata, alfazema. Correram pela sacada e, como uma relâmpago, entraram no salão; um público sensível, absorto na música que tocava.

O "poder" da música para amansar as feras é um tópico popular bem conhecido. O interessante é que agora a ciência demostra que estas palavras podem ser certas.

Já faz algum tempo que os cientistas sabem que a Sonata K.448 de Mozart modifica a electrofisiologia cerebral. Mas, além de uma simples medida de laboratório, outros estudos demostram que, por exemplo, os doentes submetidos a pequenas intervenções nas quais não é possível usar anestesia, precisam menos analgésicos se eles estão escutando com um walkman a música que eles gostam, em comparação com os doentes que escutam uma gravação estándar proporcionada pelos pesquisadores.

Alguns estudos demostram que a musicoterapia é útil para reduzir a agitação e a ansiedade dos doentes com demência. Inclusive alguns estudos concluem a utilidade de usar canções, letras de canções e escutar música no tratamento para motivar adolescentes com problemas de conduta. Talvez, em muitos casos, a música seja uma opção melhor para tratar as crianças "inquietas" do que a solução simples -e pouco acertada, ainda que muito na moda- de utilizar medicamentos.

Hoje, com o auge dos aparelhos que permitem escutar música no formato mp3, escutar em qualquer lugar a música que cada um gosta é uma coisa freqüênte. A música é, sem dúvida, um desses placebos da vida. Além disso, a possibilidade que o aparelho nos surpreenda com peças escolhidas de maneira aleatória, acrescenta o fator surpresa, que não tinhamos com as antiguas fitas de cassette.

[Tradução do autor. Me desculpe os erros]

Enlaces de interesse:
Sonata para piano nº 23 "Apassionata" - LW Beethoven
Sonata K.448 - WA Mozart

sábado, 28 de abril de 2007

Verdades

O escritor catalão Quim Monzó escreveu um conto cheio de humanidade titulado Com o coração na mão. Durante o Reveillon, um casal de namorados se comprometem assim:
“ – Seremos absolutamente sinceros um com o outro. Nunca falaremos mentiras, em nenhuma circunstância e sob nenhum pretexto.
- Uma mentira só significaria a morte de nosso amor.”

carnivoros

Lembrei este conto curto de suas páginas do livro O porquê de todas as coisas enquanto assistia o último filme de David e Tristán Ulloa Pudor, baseada no livro homônimo do peruano Santiago Rocangliolo. Trata-se de mostrar a todos a complexa teia de aranha dos sentimentos não expressados e os pensamentos segredos dos membros de uma família qualquer, um casal com uma filha adolescente e um filho adotado que moram com o pai da mulher, viuvo de faz pouco tempo. Alguma situações limite se alimentam dessa incomunicação originada pela vontade de desejar não ferir as pessõas do redor, mas que tem como resultado uma meada cada vez mais madeja progressivamente mais enmaranhada.

Nosso cérebro processa a ingente quantidade de dados que lhe chegam procededentes do ambiente; isso significa que, as possíveis inexatitudes da percepção acrecentam-se sistemáticamente com uma interpretação modulada pelas experiências passadas, por nossa vontade de torcer para que os acontecimentos terminaram de maneira diferente ou a vontade –consciente ou não– de minimizar o que temos ou aquilo que produz dor. O resultado desse processo é nossa “realidade”, nossa “verdade”, que não sempre coincide com a “verdade” das pessõas que temos por perto.

Precisamente aquela semana tinha lido a deliciosa coluna semanal do aguçado verbívoro Màrius Serra no jornal de Barcelona La Vanguardia, onde explica um engraçado caso de mal uso da informação –no caso, da Internet–, que levou ao tradutor do libro do coletivo de escritores catalão “Hermanos Miranda”(Irmãos Miranda) a colocar na orelha que o livro original tinha sido escrito por... a primeira entrada que ele achou Google ao procurar este nome: os irmãos de Honduras Marcelino e Leonardo Miranda, dirigentes indígenas condenados a cadeia...

[Tradução do autor. Me desculpe os erros]

Enlaces de interesse:
Quim Monzó e seus contos
Entrevista aos Ulloa -Pudor
Màrius Serra - La Vanguardia 19-04-2007

domingo, 15 de abril de 2007

Fagocitose urbana

No võo de volta de São Paulo assisto a impressionante representação que Forest Whitaker fiz do ditador ugandés Idi Amín Dada. A lembrança de alguma coisa sobre ele em palavras de Ryszard Kapuscinski voa sobre minha cabeça e, ja em casa, as acho; foi em Ébano.

Favela no Rio

Na releitura, tropeço com um parágrafo referido ao éxodo da mãe do ditador desde sua paupérrima aldéia do norte da Uganda até a cidade do sul (Kampala). Me chama a atençãu uma das frases, pelos livros que estou lendo estes dias. Escreveu, Kapuscinski: "Esta mulher (...) virou parte do elemento que hoje constitui o problema mais grave da África: o criado por aquelas pessoas, por aquelas dúzias de milhões de pessoas que abandonaram o campo, enchindo umas cidades ja mosntruosamente inchadas, sem achar nelas nenhuma ocupação nem lugar próprio. Na Uganda as chamam bayaye".

No meu passéio habitual (quase ritual) com a Thaïs pela Livraria Cultura do Conjunto Nacional da Avenida Paulista antes de ir embora do Brasil, adquirí Planeta Favela do californiano Mike Davis. Tráta-se de uma documentada viagem pelas megápoles da América Latina, África e Asia, onde mais de um bilhão de pessoas moram em essas construções de tijolo, madeira e plástico que pouco a pouco expandem as fronteiras das urbes até límites não suspeitados, pessoas que abandonaram o meio rural buiscando em vão a suposta riquesa das cidades.

O chama de "generalização das favelas": Em vez das cidades de luz arrojando-se aos céus, boa parte do mundo urbano do século XXI instla-se na miséria, cercada de poluição, excrementos e deterioração. Na verdade, o bilhão de habitantes urbanos que moram nas favelas pós-modernas podem mesmo olhar com inveja as ruínas das robustas casas de barro de Çatal Hüyük, na Anatólia, construídas no alvorecer da vida urbana há 9 mil anos.

A mudança climática já esta na fala das lanconetes. Palavras como "efeito estufa" e "desertização" flutuam entre a fumaça dos cafezinhos e dos cigarros; colocar este debate na opinião pública, possivelment não vai ter muito impato sobre o clima, mas pode ser útil para não continuar nossa absurda cultura do estilo de vida kleenex. O próximo passo é uma coisa que não está tão longe do assunto da mudança climática: pessoas, desenvolvimento e pobreza. A dissociação entre o que esperava-se das grandes cidades industrializadas e as receitas dos organismos monetarios internacionais, e a realidade que no fim elas tem causado, parece não fazer mais que aprofundar as diferências sociais e facilitar o crescimento da corrução.

[Tradução do autor. Me desculpe os erros.]

Enlaces de interesse:
Last King of Scotland - info + trailer
Planeta Favela - Mike Davis

segunda-feira, 9 de abril de 2007

O melhor bolinho do mundo

Para comer “o melhor bolinho de bacalhau do mundo”, você tem que ir até o City Bar de Campinas (SP). Seu dono, o portugués José dos Santos Antônio, faz um tempão que se esforça para dar satisfação aos clientes que sentan nas mesinhas metálicas da Avenida Julio de Mesquita para beber uma cerveija Bohemia fresquinha junto com o famoso bolinho.

City-Bar

As lanchonetes tem um charme especial. Muitas simplesmente são um trailer sem muitas pretensões; é sua fama, quem projeta e espalha o nome de boca a orelha. Estas lanchonetes jamais serão premiadas com uma estrela Michelin; elas tem outros parámetros, mas sua qualidade e seu sabor estão garantidos.

Faz 20 anos, Beto Gambugge dirige o Cachorrão de Campinas, escolhido como uma das melhores lanchonetes onde tomar un cachorro quente. Durante o dia, é uma motor-home simplezinha estacionada perto da igreja Madre Cecília do bairro de Cambuí; porém, ao por do sol, ela abre suas portas, o espaço se multiplica, acende as luzes de néon, coloca meia dúzia de mesinhas e cadeiras de plástico na esquina, e comença a servir uns impressionantes sanduíches. Já vi por perto mais de um Porsche e alguma Ferrari vermelha aguardando cachorro quente.

Provavelmente os melhores “hot dog” do mundo, na opinião dos especialistas, são os da lanchonete de Paul e Betty Pink em Los Angeles, perto do Hollywood Boulevard. O taxista que me acompanhou pela cidade uma noite de fevereiro, me contou que algumas pessõas percorrem os Estados Unidos, de costa a costa só para comer um sanduíche em pé no Pink’s Hot-Dogs após aguardar uma fila comprida. Desde 1940, este lugar, sem nenhuma pretensão de luxo, sem os artifiços nem os enfeites da vizinha meca do cinema, nem o falso boato vazío de Beverly Hills, serve uns cachorros quentes deliciosos.

As lanchonetes e as garçonettes que trabalham nelas, tem uma magia especial. Já estiveram presentes em muitas road-movies. Também me lembro da capa de Breakfast in America de Supertramp (1979), com aquele primeiro plano de uma garçonette enchida servindo um suco de laranja.

Coincidentemente, a semana passada foi a estréia do filme "cult" O cheiro do ralo. Tráta-se de uma adatação do livro homônimo de Lourenço Mutarelli. Um texto impressionante e demolidor centrado nas tres obsessões do protagosnita -dono de uma casa de penhor-: o nauseabundo cheiro do ralo da loja, um olho quase-humano que mostra a todos enquanto diz “este é o olho do meu pai; ele morreu na guerra, na segunda” e... a garçonette do boteco onde toma lanches –mais exatamente, ele tem obsessão pela sua bunda:
Ela me entrega o lanche. Ela quase sorri.
Ela se vira para buscar o refrigerante.
Eu poderia ficar uma semana só olhando ela se virar.
Este livro já é outro?
Mostro a capa.
Paul do quê? (...)


[Tradução do autor. Me desculpe os erros.]

Enlaces de interesse:
City Bar, Campinas
Cachorrão, Campinas
Pink's Hot Dog, Los Angeles
O cheiro do ralo

sábado, 24 de março de 2007

O ônibus nº 8

O Professor Girassol hospedou-se no quarto 122 do Hotel Cornavin de Genevra. Porém, quando Hergé publicou O Caso Girassol, este quarto não existia; foi colocado numa das remodelações devido á insistência dos tintinólogos para alojar-se nela. Hoje, um Tintim de dois metros da a bem-vinda aos hóspedes.

Hotel Cornavin


Mas esta não é a única curiosidade do Cornavin; neste hotel também está o relógio mais alto do mundo: trata-se de um engenho mecânico de 30,2 metros de altura colocado no buraco da escada.

La place Cornavin possui um charme especial. Ali está a estação central de Genevra, nela començam algumas ruas que conduzem inevitávelmente até o lago Léman e, além disso, aí tem um do seus pontos o ônibus da linha 8. Este ônibus tem a particularidade de se parar perto da sede de alguns organismos internacionais -como a Unicef, a OMS, a ONU, ou a Organização Internacional do Trabalho-; assim, num trajeto curto de poucos minutos é possível identificar pessoas de dez ou quinze paises distintos e escutar bastantes idiomas dessa maravilhosa Babel dos 6.912 idiomas vivos que existem no mundo.

Um passageiro portugués sentado no meu lado, antes de descer do ônibus me oferece o Correio da Manhã que acabou de ler. Acho um artigo que descreve a recente publicação de António Damásio no jornal Nature, onde descreve os resultados de um surpreendente estudo que demostra a relação das emoções nos juízos morais: observou que as lesões da área ventromedial do córtex cerebral prefrontal afetam o resultado de alguns tipos de juizo pelos quais uma determinada ação normalmente produz aversão moral. São pessoas que ten uma marcada redução das emoções sociais -as que provocam a culpa, a vergonha ou a compaixão-, e poderia explicar porquê existem indivíduos que matam "em nome do bem coletivo". Quem sabe se algum dia será obrigatório se fazer um scanner antes de presidir paises ou de dirigir exércitos.

[Tradução do autor. Me desculpe os erros]

Enlaces de interesse:
Tintim e o Hotel Cornavin
Ethnologue - Idiomas do mundo
A. Damásio - Lesões no cérebro influenciam moral

sábado, 17 de março de 2007

O chefe do chefe

"O melhor do personagem é o que o personagem não é", diz Kristoffer a Ravn, o protagonista de O Chefe de tudo isso ("Direktoren for det hele"), o último filme de Lars von Trier.

Boss' eye

Em resumo: Ravn é dono de uma empresa de informática e decideu se inventar o Chefe de tudo issopara lidar tranqüilamente com sua meia dúzia de empregados e poder tomar decisões sem a incomodidade de ter que carregar com a culpa nem ser o alvo das críticas nem da ira dos trabalhadores. Quando Ravn quer vender sua empresa a ums islandeses que cismam para tratar direitamente com esse personagem, se ve forçado a contratar Kristoffer, um ator desempregado, para que visite a oficina durante uma semana, interpretando a esse Big Brother.

O medo e as aparências são os melhores aliados do poder, as melhores armas para conseguir a submissão. Apariências para vestir um corpo humano e medo pra afastar aos outros sem ter que depender constantemente de um par de socos. A estratégia roça a fronteira do "ideal" se é possível descaregar a culpa -possívelmente o esporte com mais adeptos do mundo, mais do que o futebol-, sobretudo se esse culpável é como um deus invisível e distante, pai de todo mal.

Um curioso artigo de Patricia F. de Lis no jornal espanhol El País de hoje leva o título 750 milhões de euros para enganar o Google. Fala das empresas dedicadas a conseguir que outras empresas estejam nos primeiros lugares dos buscadores como Google usando manipulações -que, ao mesmo tempo, permitem "maquiar" as páginas que falam mal dos interessados-.

O mesmo filme de Lars von Trier engana (mas engana no bom sentido): não é a comédia levinha que anuncia o narrador ao começo. É o espelho cruel que mostra a conduta de qualquer grupo humano onde um indivíduo tenha (ou deseje) o poder sobre os outros. Ainda não identificaram a situação laboral de nenhum conhecido?

[Tradução do autor. Me desculpe os erros]

Enlaces de interesse:
O Chefe de tudo isso
Trailer de "El Jefe de todo esto"
750 millones para engañar a Google

sábado, 10 de março de 2007

40 horas de paciência

No filme A vida dos outros, o capitão Gerd Wiesler, competente oficial da Stasi, ensina a seus alunos que, para conseguir que o prisioneiro confesse, "tem que ter paciência, 40 horas de paciência".

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No inquietante romance de ciência-ficção (ou, deveríamos dizer de ciência-anticipação?) "Mil novecentos oitenta e quatro", George Orwell escreve:

É claro, não era possível saber quando vigilavan a gente. Não era mais que uma conjetura saber quantas vezes e como a Polícia do Pensamento captava a comunicação da gente.

A vigilância a que o ser humano submete á seus congêneres é uma das condutas que lhe diferencian dos animais. Alguns anos atrás, o paleontólogo Stephen Jay Gould escriveu um artigo no qual falava dos muros de ouro que alguns pensadores e científicos tinham levantado para tentar preservar e diferenciar o ser humano dos outros animais. Os tijolos destes muros eram condutas como a fabricação de ferramentas, a capacidade de abstração ou a cultura.

Porém, bastantes estudos publicados nos últimos anos tem demostrado que algumas espécies animais (especialmente alguns primates) são capazes de fabricar instrumentos e de os usar. Algumas observações demostram que alguns pássaros podem planificar seu futuro (outra das capacidades supostamente de exclusividade humana) e armazenar alimentos em lugares estratégicos para épocas de penúria. Inclusive os pesquisadores descobriram padrões culturais em colônias de macacos.

Faz tempo que sabemos que, por exemplo, entre as formigas ou as abelhas, existem rainhas e obreiras; existen sindicatos? Bom, provavelmente não com este nome; mas, também descobriram condutas cooperativas em espécies animais, padrões de comportamento que não beneficiam direitamente ao indivíduo, e sim a comunidade.

Inclusive uma coisa como o conforto em casa, também não é exclusivamente humano: alguns grandes primates, antes de se sentar buscam folhas onde colocar suas nádegas, como una almofada fofa para não se sentar direitamente na desagradável umidade da floresta.

Á vista destas pesquisas, talvez os dois últimos muros dourados seríam o dinheiro e o sistema policial. Condutas como o pagamento a outros congêneres em troca pelo trabalho (o uso do "dinheiro") -o que está estreitamente relacionado com o conceito da escravidão-, ou o julgamento moral e, com ele, a existência da polícia que permite que um indivíduo com poder controle outros indivíduos sem esse poder. Se for assim, é muito triste o que nos separa dos outros animais.

A vida dos outros é uma excelente reflexão sobre o sistema policial. Para os interessados, um artigo de José Comas explica a experiência pessoal do próprio intérprete do filme: a esposa do ator Ulrich Mühe foi informadora da Stasi.

[Tradução do autor. Me desculpe os erros]

Enlaces de interesse:
A vida dous outros
Trailer - A vida dos outros
A vida dos outros - ficha têcnica
George Orwell - 1984
Trailer - 1984
El actor, su mujer y la Stasi

domingo, 4 de março de 2007

Eclipses e nuvens de chuva

Algumas pessoas se interessaram mais pelos eclipses ao ler as aventuras de Tintim no Templo do Sol do que olhando o esquema tradicional que aparece nos livros da matéria de Ciências Naturais da escola.

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Apesar de que, como indica Víctor Ruíz no seu blog, no álbum é possível identificar algumas imprecisões astronômicas e possivelmente antropolôgicas -como a inverossímil reação de medo dos Incas frente a um fenômeno astronômico que supostamente conhecíam bem-, Hergé consegue transmitir várias idéias, como os ciclos da natureza e a mudança inerente a todo o que está vivo.

A referência nao é fútil. Este ano se comemora o centenário do nascimento de Hergé en Bruselas e a noite do 3 de marzo foi possível observar um eclipse total da lua desde Europa e alguns pontos de América.

A imagem do eclipse -igual como aquela da nuvem de chuva que esconde un momento a visão da luna cheia e bonita, ou a idéia de que a noite é, somente, o espaço entre dois dias ensolarados-, resulta útil para reflexionar sobre os altibaixos da vida, para os enfrentar sem tanto medo, com mais resiliéncia. Ter conscência de que todo tem data de caducidade (tanto o que é ruim quanto o que é bom), de que a vida é feita de ciclos que començam e acabam, é um ótimo exercício para malhar os neurônios e enfrentar a vida de maneira positiva, sem se perder pelo labirinto do medo ou o labirinto da incerteza.

[Tradução do autor. Me desculpe os erros]

Enlaces de interesse:
Página oficial de Tintim e Hergé
Actos do centenário do nascimento de Georges Remi -Hergé-
As aventuras de Tintim em portuuês
Cidades perdidas
Página dedicada aos eclipses
Livro Não Medo na empresa e na vida

sábado, 24 de fevereiro de 2007

Furufuhué

Nas montanhas mais meridionais da cordilheira dos Andes existe um passaro com escamas en lugar de penas que só pode ser visto contra o sol. Explicam que tem um poderoso assobio: dá para escutar de qualquer parte da Terra.

Los Andes antes de llegar a Cusco

Caminhando pela cordilheira, as pessoas também se encontraram com o Huecuvú, um gênio que pode adotar qualquer forma, inclusive a humana, e que destroi a vida do homem e lhe provoca doenças. Os habitantes do lugar atribuem a este ser maligno os animais mortos e os ossos que são achados nas passagens entre os gigantes de pedra e neve.

O cérebro humano tem a necessidade de procurar explicações aos acontecimentos negativos de causa desconhecida ou incerta. Também tem tendência a procurar sinais e indicios externos para poder confiar no bom desenlace dos sucessos do futuro. Este costume, além da utilidade pessoal e social que possa ter (para o controle de condutas, para se sentir protegido, para ter força interior e conseguir um objetivo), é uma boa amostra da creatividade humana e já deu muitas páginas de excelente literatura.

O caminho aberto no seu momento por Martin Seligman e outros colegas levou até uma nova conceição da mente, sua relação íntima com o organismo e o poder que tem as atitudes e a visão positiva da vida.

Estou lendo um ótimo exemplo prático dessas idéias. Tráta-se do livro Después del día 10 ("Depois do dia 10") de Carlitos Páez publicado por Alienta Editorial (Barcelona, 2007).

Considerando que todo mundo conhece a tragedia aérea dos Andes e as vicissitudes dos 16 sobreviventes que conseguiram voltar ao mundo após 72 dias na cordilheira, seu autor escolhe uma perspetiva diferente, que ressalta o aspeto humano da aventura, a força mental.

No livro, Carlitos Páez simplesmente "olha o espelho retrovisor de sua vida" e explica de uma maneira incissiva, amena, e auto-crítica se precisar, como a atitude de cada pessoa e a atitude do grupo foram fundamentais para conseguir sobreviver em condições extremas e vencer o medos e o desânimo.

Tomar conhecimento -dez dias depois do accidente- que o mundo tinha abandonado sua procura, ter vontade de sair para frente e crer cada um seu papel (de médico, de engenheiro de telecomunicações, de inventor, apesar de não ser nada de isso), foram, na opinião do autor, os códigos para conseguir seu objetivo.
Acho que isso é aplicável a qualquer empresa humana.

[Tradução do autor. Me desculpe os erros.]

Enlaces de interesse:
Mitos e lendas de América Latina
Carlitos Paez
O accidente dos Andes

domingo, 18 de fevereiro de 2007

Mas, que tem de certo, o que percebo?

Uma cena do filme Melinda e Melinda de Woody Allen contém o diálogo seguinte:
Ele: Você não percebeu que faz muito tempo que eu estou apaixonado por você??
Ela: Nem sequer percebi que eu mesma estava apaixonada por você.

Recordando a Maigritte

Boa parte de nossa conduta depende do jeito que percebemos o mundo -ou seja, da maneira como o mundo entra pelas janelas de nosso cérebro, umas janelas que podem ter os cristais sujos ou lascados, ou inclusive estar coloridos de pink ou de verde, e nós não ser conscientes do tema.

Durante um almoço recente, no qual falamos de bastantes livros e de um pouco de psicologia, Josep Gajo me recomendou a leitura de Si no lo creo, no lo veo (Se não acredito, não vejo) de Xavier Guix publicado pela editora Granica (Barcelona, 2005). Trata-se de um ensaio ameno e documentado que desenvolve, como indica seu subtítulo "o processo de construção de nossa própria imagem do mundo e de nós mesmos".

Tentar solucionar a incógnita da distância entre a realidade e a maneira como nós a percebemos é um dos assuntos interessantes e atualmente candentes da neurologia e das ciências da conduta. E muitos artistas usam esta imperfeição da percepção para suas criações.

Agora mesmo, a feira de arte contemporâneo ARCO 2007 (Madrid, 15 - 19 de fevereiro), tem em exposição algumas obras de Joan Fontcuberta, um ótimo fotógrafo que ja tocou o assunto da percepção visual e tem feito pensar muito sobre a credibilidade das coisas que vemos. Na ARCO, também expõe o engenhoso artista de Cabo Verde Albertino Silva: usa sapatos velhos para recriar passarinhos ou cabeças de leão mediante um hábil exercício de sugestão.

Faz duas semanas, o suplemento CULTURAS do jornal La Vanguardia de Barcelona dedicou suas páginas centrais a Hanoch Piven, um caricaturista genial que simplifica ao máximo os personagens que ele retrata e consegue que o cérebro do espectador faça uma reconstrução mental da imagem do personagem original a partir de alguns detalhes que seduzem os neurônios e os obrigam a buscar nos arquivos da memória.

A imperfeição da percepção, que deixa brincar aos artistas, também é uma fonte de conflitos e mal-entendidos. Ser conscientes de nossas limitações na percepção contribui á relativizar algumas situações. O livro de Xavier Guix fala bastante do tema.

[Tradução do autor - Me desculpe os erros]

Enlaces de interesse:
Melinda e Melinda
Xavier Guix
Joan Fontcuberta, fotógrafo catalão
Albertino Silva, artista de Cabo Verde
Hanoch Piven, retratista
Blog de Hanoch Piven

sábado, 10 de fevereiro de 2007

Odisséias

"Nos cruzeiros de luxo, a média de idade está entre os setenta e cinco anos e a morte".
Me esbarro com esta frase do último livro de Javier Reverte, La aventura de viajar (A aventura de viajar), um presente do meu amigo Mariano Madurga.
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Estes dias lembrei alguns trechos da Odisséia ao ler as sucessivas notícias sobre o drama do cargueiro Marine I, que passou uma semana fundeado no limite das águas jurisdicionais da Mauritânia, ao parecer com quase 400 pessoas a bordo, a maioria originárias da Ásia e, outras, de origem subsahariano. Parece que o barco tem passado dois meses no mar e ainda se desconhece o estado de saúde dos passageiros, mas algumas ONGs tem prontos dispositivos de atenção sanitária em Nuadibú, onde foi autorizado o desembarque.

Ítaca -como metáfora- e os objetivos que as pessoas se colocam na vida, não sao alheios aos fenômenos migratórios que tantas páginas ocupam. Também não a pobreza (ou, melhor ainda, as desigualdades sociais).

Numa recente entervista, o sociólogo Alain Touraine explicou: "Sustento que num continente como o nosso [a Europa], e a nível mundial, o problema central continua sendo a desigualdade e a exclusão social" (El Periódico de Cataluña, 28-01-2007).

Talvez seria preciso divulgar mais os resultados de pesquisas como a que descreve a jornalista Amanda Mars na sua reportagem Coisas que o dinheiro pode comprar ou não, no qual repete o que alguns sociólogos e economistas tem demosntrado mais de uma vez: a partir de um nível mínimo de ingressos, o esforço que supõe conseguir mais dinheiro não é direitamente proporcional á felicidade que ele traz. O estudo descrito na reportagem cifra este mínimo em 15.000 dólares anuais (32.000 reais).

A chave, como sempre, está no que significa "felicidade" para as pessoas: se é aquela ilusão apoiada pelo consumismo enlouquecido e sem freio, com seus paraísos de papelão com falsos cenários e sonhos de papel cuchê, ou, pelo contrário, se é a sensação de bem-estar que produzem em nós as coisas pequenas (que com freqüência não é preciso comprar).

[Tradução do autor. Me desculpe os erros]

Enlaces de interesse:
La aventura de viajar - Javier Reverte
Notícia do Marine I (10-02-2007)
Cosas que el dinero puede comprar, o no

domingo, 4 de fevereiro de 2007

Por um fio

Na sua seção habitual no El País Semanal, Àlex Rovira escreve hoje sobre as circunstâncias da vida que nos lembran a fragilidade da existência e nos fazem repensar sobre nossos objetivos.

Atardecer en Puerto Barrios

O vendaval originado por estes golpes acostuma a abrir janelas que mostram uma paisagem com veredas totalmente diferentes as que a pessoa estava seguindo. Nesta nova visão, os seres humanos de nosso redor ganham uma dimensão nova, e cada momento autêntico passado com eles adquiere um valor bastante superior ao de qualquer posessão material.

Iris Baleeiro me presenteou o livro Por um fio do médico Drauzio Varella (Companhia das Letras, 2005); nele, o autor conta histórias de doentes aos quais a saúde puz a vida em jogo, e esta curcunstância lhes fiz reconsiderar o valor de seus valores. "Nada transforma tanto o homem quanto a constatação de que seu fim pode estar perto".

Testemunha extraordinária desta reflexão é a história em primeira pessoa que conta Eugene O'Kelly em Momentos Perfeitos ("Momentos Perfectos", Alienta Editorial - Barcelona, 2007): os médicos diagnosticaram um tumor cerebral a este conhecido diretor da consultora KPMG de 53 anos; só tinha três meses de vida. Decideu vivir essas horas com a máxima intensidade, e fiz isso fortalecendo as relações com as pessoas que tinham um significado para ele; com isso consiguiu transformar o máximo número de instantes em "momentos perfeitos".

La Revista Negra de Jérôme Savary que se apresenta em Barcelona me faz pensar no tema. Já falei dela no post do 27 de janeiro. Ontem voltei a assistir este musical com meus filhos Maria e Martí.

Porém, durante a semana passada entre as duas apresentações aconteceu uma coisa. A quarta 31 de janeiro, o ator e músico Jimmy Justice (não deve se confundir com o cantante de rock) de 75 anos, morreu sobre o cenário pouco antes de terminar a sessão, enquanto ele interpretava seu papel de Jimmy, um entranhável jazzman que zanzava pela Nova Orleans devastada pelo furacão Katrina e explicava a história dessa música com sua voz poderosa e gutural, e seu sorriso de gigante bonachão.

A companhia, com aquela fortaleza que dão os golpes baixos da vida, decideu retomar as apresentações e transformar a obra num homenagem ao seu colega Jimmy. Um homenagem sem estridências nem barulho. Só podem perceber-lho as pessoas com a fortuna de ter assistido as apresentações antes e depois de sua desaparição: nenhum ator novo esta substituendo o Jimmy; porém os atores e cantantes piscam a olho de de forma quase impercetível, mas cheios de emoção. Por exemplo o sentido "I Love you, Jimmy" que encerra um triste blues com una coreografia excelente sobre imagens do Ku-Klux-Klan projetadas em branco e preto sobre a enorme tela de fundo.

Enlaces de interesse:
Àlex Rovira: Reveladora fragilidade
Drauzio Varella - Por um fio (Companhia das Letras)
Jérôme Savary
Jimmy Justice

sábado, 27 de janeiro de 2007

Re-construção

Viajo com a Thaïs até Vigo (Galícia, Espanha) para ministrar uma palestra sobre a criatividade no dia a dia como fonte de otimismo, convidado por Marisa Real, direitora do Club Faro de Vigo.

vigo-pneu

Como exemplo da chispa que nos leva a ser criativos em qualquer âmbito da vida, falo sobre os numerosos e engenhosos usos que são dados aos pneumáticos usados en todo o mundo, desde solas de alpargatas até brinquedos de criança, passando pela jardinagem ou os protetores laterais das embarcações.

A força para a re-construção é, principalmente, um ato de criatividade empurrada pela esperança de ir para frente; otimismo. No vôo de volta a Barcelona examino Artistas de lo que queda. Las escrituras de Escombros de Zulema Moret, um livro que recomendou faz umas semanas o amigo Txetxu Barandiarán no seu boletim Reposando.

Reconstrução, resurgimento, recuperação.

Essa mesma noite assitimos ao magnífico espetáculo que a comapanhia de Jérôme Savary apresenta em Barcelona até o 25 de fevereiro: La Revista Negra. Trata-se de um musical impecável que repassa a história do jazz e recupera a memória de Josephine Baker e seu famoso (e escandaloso, na época) espetáculo do mesmo nome em París. Um dos achados da montagem é que a ação decorre na Nova Orleans devastada pelo furacão Katrina, com um entranhável pianista que, acompanhado de outros três personagens, zanza sobre uma balsa pelas ruas inundadas da cidade buscando seu piano enquanto lembra os grandes momentos do jazz e suas connotações sociais. Uma história crítica, uma história triste, mas também uma história que transpira a vontade de reconstrução, de renacimento. De resiliencia.

Freqüentemente, estes golpes da vida que tanto receiamos, se transformam em molas que nos empurram para achar soluções mais ou menos criativas para ir para a frente. Olhando o pôr do sol fraco do inverno sobre o Atlântico, espalhando sua luz dourada sobre a ativa ría de Vigo, me lembro do pesadelo escuro do desastre do petroleiro Prestige que bateu estas costas uns anos atrás. Imagens de desespero e impotência misturadas com a solidaridade de muitos voluntários que passaram o Ano Novo de 2003 naquelas praias pretas de petróleo.

[Tradução do autor. Me desculpe os erros]

Enlaces de interesse:
Club Faro de Vigo
Nota sobre a palestra no Club Faro de Vigo
Blog de Txetxu Barandiarán
Jérôme Savary

Receita para fabricar escândalos

Mudar da água para o vinho, usar os meios que a pessoa possui com inteligência criativa e inventiva, acostuma a despertar a mesma simpatia da mítica vitória de David à frente de Golias.

Elvis goes to Hollywood

Vejo uma crônica que escreveu Enric González para o jornal El País o 18 de janeiro sobre a versão da ópera Salomé de Strauss dirigida por Giorgio Albertazzi. Pelo jeito, Albertazzi consiguiu que nos dias prévios se genesse uma polêmica nos meios de comunicação italianos baseada no suposto alto voltagem erótico da montagem, que tinha duas salomés (Francesca Patanè e Maruska Albertazzi) que apareciam peladas e depiladas. O próprio diretor encarregouse de alimentar o escândalo com os detalhes mais apetitosos revelados pouco a pouco, no momento justo -como corresponde a um bom narrador de histórias, tanto sobre papel, como na tela o sobre um cenário.

O interessante do caso é que, pelo que explica a crônica, o balão do escândalo se encheu e cada vez tinha mais pessoas e mais jornais se posicionando á favor e em contra da montagem... e ninguém tinha visto ainda o espetáculo.

Com o excesso de informação ao que estamos submetidos e com esse jogo de espelhos múltiples que mistura a realidade com a ficção quase sem nenhuma fronteira, resulta muito fácil vender gato por lebre enquanto a pessoa baixa a guarda e se esquece de comprovar as provas que sustentam uma informação específica. Não é estranho que um turista despistado que paseie por Holywood Boulevard a meia noite, pegue sua câmara e comence a apertar o disparador como um possesso diante da visão fugaç de um homem vestido com uma capa branca, achando que Elvis continua vivo, como assegura a lenda.

[Tradução do autor. Me desculpe os erros]

Enlaces de interesse:
E. González: 'Salomé' apta para menores
Salomé - Wikipedia
Giorgio Albertazzi
Reparto de la Salomé de Albertazzi
Celebridades en Hollywood Boulevard

domingo, 14 de janeiro de 2007

Na fronteira

No informe anual sobre patentes da Organização Mundial da Propriedade Inteletual (OMPI) acho o dado a seguir: em 2004, os residentes nos Estados Unidos solicitaram 185.536 patentes, enquanto isso, no mesmo período 135.196 patentes foram registradas por não-residentes nesse país (onde representam uma proporção de habitantes muito menor).

En la frontera

Ainda que o dato possa ter numerosas explicações, uma leitura possível é que se mudar de lugar e trocar a rutina -cruzar a fronteira-, junto com a necesidade de ir para frente, estimulam a inventiva, a criatividade.

Uma ou duas vezes no ano repasso os artigos de jornal que pouco a pouco amontoei sobre a mesa para considerar, se os guardo definitivamente, ou se os levo ao contêiner de reciclagem de papel. Esta perspectiva temporal de meio ano permite julgar melhor o interesse das notícias ou as crônicas, com o conhecimento do que aconteceu depois, quais foram o desenlace ou as conseqüências.

Às vezes, este jogo coloca na frente dos olhos histórias que acabam tendo algum denominador comum. Nesta oportunidade, a palavra chave poderia ser "a fronteira".

1.- Libération do 1 de agosto de 2006 contava a situação kafkiana das terras entorno do lago Ontário, onde mora a tribu dos Mohawks. Trata-se de uma zona chamada Akwesasne; alguem traçou sobre ela a fronteira entre os Estados Unidos e o Canadá. Akwesasne está dividida em dois e tem moradores que precisam cruzar a alfandega quatro ou cinco vezes ao dia -com as filas correspondentes- para poder fazer seu trabalho. Inclusive tem casas divididas em dois por uma dessas linhas invisíveis, vestígio da ancestral delimitação do território de muitas espécies animais. Um dos afetados comenta, com ironia: "Uma vez discutí com minha esposa em nosso cuarto de Canadá e ela me mandou ir a dormir no quarto dos lado, nos Estados Unidos".

2.- El País do 29 de outubro de 2006 publicou uma reportagem titulada Os meninos esquecidos da lixeira; descreve o povoado povoado ilegal da Cañada Real Galiana, somente a 10 quilômetros do centro de Madri. Falam que na favela moram millar de meninos que não assistem a escola e vivem entre lixo e droga. Essa situação é notícia com destaque nos jornais da Espanha, onde os meninos da rúa quase não existem e tem uma rede de boas escolas públicas gratuitas. Outra fronteira, a da marginalição e a pobreza; essa, não por ser invisível é menos trágica.

3.- A Folha de São Paulo do 25 de agosto de 2006 publicou uma história que parece ter sido escrita pelo Bocaccio no seu Decamerón. João Pereira da Silva (34 anos, raça negra) furtou uma carteira com 10 reais e está na cadeia há quase dois anos. João Pereira da Silva (28 anos, raça branca) roubou 162 reais com uma arma, foi condenado a três anos e meio, ficou seis meses na prenitenciária e fugiu. Os pais dos dois tem os mesmos nomes. "O João negro" cumpre pena do seu homônimo branco; há um ano, um exame datiloscópico comprovou a confusão, mas a situação continua do mesmo jeito. Alguém cruzou a magrinha e ainda mais invisível fronteira da verdade, a realidade cinzenta, a identidade escorregadia.

A vida consiste em fazer de funâmbulo sobre as fronteiras perigosas que os homens traçamos; passar de um território a outro -ou, pelo contrário, conseguir não cruzar a divisória-, com freqüência requer a habilidade dos equilibristas.


Trapezistas do espetáculo El Gegant dels 7 Mars (Fòrum 2004 - Barcelona)



[Tradução do autor. Me desculpe os erros]

Enlaces de interesse:
Estadísticas sobre patentes de la OMPI
Akwesasne
Primeras naciones de Quebec
Los niños olvidados de Madrid
Bocaccio
'João negro' cumpre pena de 'João branco'
Fòrum de les Cultures - 2004

segunda-feira, 8 de janeiro de 2007

Don Quixote na imobiliária

Elas recebem nomes diferentes, mas a essência é a mesma: construções desiguais de madeira, latão, algum tijolo e pouco concreto, amontoadas em colinas que, faz poucos anos eram os aredores das metrópoles.

Ranchitos en Caracas

"Nenhuma destas ruas tem nome / nenhuma destas sombras tem dono (...)" cantava Willie Colón -curiosamente apelidado o arquiteto da salsa urbana-, e parece que ele está descrevendo as favelas cariocas, as villas miseria portenhas, as locations sulafricanas ou os ranchitos de Caracas.

Os fenômenos sociais derivados da dificultade para ter acesso á uma moradia digna ten formas muito diversas. Para chamar a atenção dos políticos ao respeito dos numerosos sem teto de París, faz uns dois meses foi criada a associação Les enfants de Don Quixotte e parece que eles tem conseguido uma resposta do primeiro ministro, quem garante que a França vai considerar a moradia digna como um direito fundamental, igual á educação ou á saúde.

O que resulta curioso é a dinâmica e a reverberação deste processo, que tem os ingredientes a seguir: a sustentação dos meios de comunicação e as novas tecnologias, a originalidade da posta em cena (cem barracas compradas numa loja de esportes e colocadas em fila junto ao canal de Saint Martin), assim como o momento político (poucos meses antes das eleções presidenciais).

Interworld Radio é definida como "uma rede global gratuita para emissoras de rádio e jornalistas, com notícias e programas sobre questões do mundo e contextos locais". Achei-a casualmente, enquanto procurava coisas sobre o impacto da falta de informação e a saúde. Me chamou a atenção uma história de Joel Okao Tema titulada: Morrer pela informação; em ela explica como, faz vinte anos, um distrito de Uganda quedou devastado por uma doença desconhecida que matou centenas de pessoas. O povo a chamava a doença do "magrinho", e foram necessários mais de dez anos até a chegada na área da primeira informação sobre o aids, suas causas e sua prevenção.

Apesar que, freqüentemente, temos a sensação de estar transbordados pela informação, o grande desafio atual é conseguir selecionar a informação essencial e conseguir que chegue a todos de forma confiável e rápida.


[Tradução do autor. Me desculpe os erros.]

Enlaces de interesse:
La revuelta de los hijos de Don Quijote (El País)
El boom de la vivienda y sus consecuencias en Francia (La Vanguardia)
Uganda: morir por la información

quarta-feira, 3 de janeiro de 2007

Circo

Na época em que a oferta de emoções era infinitamente mais limitada, a gente assitia ao circo. Em Barcelona, era tradição aproveitar a tarde do 26 de dezembro (feriado na Catalunha), após o segundo almoço familiar consecutivo, apesar que as diferentes companhias de circo ficassem algumas semanas na cidade.

Circ Raluy

A última vez que entrei no circo foi seis anos atrás. Junto com Jordi Nadal e nossas crianças respeitivas, assistimos a sessão matinal do circo Raluy, que por regra geral ergue suas barracas e coloca suas belas carruagens no Port Vell (porto antigo) de Barcelona, frente ao aquário (com seu corredor submergido na piscina dos presumívelmente vorazes tubarões) e o cinema IMAX (com vertigens visuais envolventes e em tres dimensões). Ou seja, emoções em letra maiúscula, para saciar a fome que parece ter a sociedade veloz e epidérmica do século XXI, aquela que rende culto ao descartável.

O circo e seus arredores -com freqüência cobertos pela pátina romántica que nós damos aos mundinhos meio bohemios, meio desconhecidos, com pouca relação com a realidade- tem sido argumento de filmes, cenário de romances e tema de pinturas famosas. Uma exposição no museu Picasso de Barcelona permite fazer um percurso pelas conhecidas referências circenses de Picasso até o próximo fevereiro.

No meu monte (já muito alto) de pendências tenho Mr Vertigo de Paul Auster, a história de um menino orfão e seu mestre Yehudi; o mestre o ensina a levitar e a dupla comença a apresentarse em todos os circos dos Estados Unidos. Umas frases pegadas sem muito buscar:

No fundo, acho que não é preciso nenhum talento especial para que uma pessoa se levante do chão e fique suspesa no ar. Todos levamos isso no interior -homens, mulheres e crianças-, e com suficiente esforço e concentração, todo ser humano é capaz de duplicar ás façanhas que eu fiz quando era Walter o Menino Prodígio. Você tem que aprender a deixar de ser você mesmo. Esse é o ponto de partida, e o resto sai daí. Você tem que se deixar evaporar. Deixar que seus músculos se relaxem, respirar até que você note que sua alma sai de você, e nesse momento, fechar os olhos. Assim é como se faz.

A questião de fundo é, como tantas vezes, saber onde está a fronteira (e quem a delimita). As coisas que são circo e as coisas que não são circo. Da mesma forma que aquele doutor Simão Bacamarte saido da ótima caneta de Machado de Assís que, no O alienista decide fundar uma casa de loucos, onde comença encarcerar pessoas lúcidas.



O malabarista dançante, espetáculo circense-musical no barri Gòtic de Barcelona.

[Tradução do autor. Me desculpe os erros]

Links de interesse:
Circo Raluy
Museo Picasso - Exposición Picasso y el circo